Houve
uma época em que surgiu na internet, uma misteriosa escritora. Esta nunca
mencionara o seu verdadeiro nome, nem muito menos a sua imagem e detalhes de
sua vida pessoal, para que ninguém pudesse descobri-la. Apenas a conheciam como
Lilla Bittencourt. O seu interesse de fato era tão puro e simplesmente a
Literatura Licenciosa. O seu rosto era uma incógnita para os seus leitores ávidos
em degustar cada linha de seu erotismo levado à flor da pele. Os números de
seus acessos só cresciam.
Muitos
a julgavam como um gay frustrado ou simplesmente uma trans relatando as suas
aventuras sexuais, dado o seu exímio capricho em descrever tão detalhadamente
sobre o sexo anal.
Quando
recebia comentários em seus textos ou e-mails de pessoas falando sobre a tal
suspeita, pegava-se rindo sozinha em frente a tela do computador. Já que
naquela época os modernos telefones celulares não existiam.
***
Até
que um dia, ela confiou a sua vida para outro escritor. Diferente dela, Heitor
Kannemberg amava se mostrar e não tinha o menor pudor em relatar as suas
conquistas, digamos sexuais. Como dividiam e compartilhavam da mesma paixão
pela escrita e um amor incondicional pela Literatura Erótica, assim como em
seus textos a cada novo contato, ele conseguia minar ainda mais a sua
confiança. E mal ela sabia o plano em que ele tinha em sua mente, por detrás de
todo aquele interesse.
Por
acreditar nele, que aqui não passa de um mero pseudônimo, conseguiu arrancar
dela as suas mais íntimas confissões sexuais.
Heitor
Kannemberg por achá-la uma mulher à frente do seu tempo, sem nenhum tipo de
amarras às convenções sociais, no fundo bem no fundo a desejava. Ainda mais que
depois de muita insistência, a tal escritora misteriosa, não enviou somente
foto de seu rosto, como também lhe confiou um nudez.
Ele
por sua vez, não escondeu o seu entusiasmo, ainda mais por ela possuir uma pele
muito clara e seus pensamentos volitaram por caminhos sombrios de seus fetiches
sexuais.
E
a nossa cara escritora licenciosa confiava a cada dia mais em Heitor
Kannemberg...
Os
contatos deixaram de ser através de mensagens e passaram para os telefonemas.
Ambos já conheciam as suas vozes. O também desejo florescia entre os dois,
assim com a passagem do tempo. E ela muito inteligente não reconhecia os sinais
nas entrelinhas das frases daquele homem. E seus desejos passeavam por seu
corpo, todas às vezes, que via a sua imagem refletida na tela do computador.
Pois se mostrava bastante atraente e viril. De cor morena... E o dote masculino
bem definido.
Em
uma bela manhã, enquanto Lilla revisava um de seus textos, ouviu uma
notificação do Messenger. Heitor Kannemberg após digitar um bom dia, perguntou
se seria incômodo fazer uma ligação, pois teria uma proposta a lhe fazer.
Prontamente, Lilla atendeu lhe dando permissão e ele assim o fez. No mesmo
instante o celular começou a tocar e, ao identificar no visor que realmente
fazia contato. Ao atendê-lo eufórica, depois dos cumprimentos de praxe, ele
então fez a sua proposta: Queria que ela trabalhasse para ele.
No
início, Lilla ficou animada com o que ele lhe propusera. Porém, por outro lado
ficou pensativa. Não o conhecia o tão bem suficiente para saber se poderia
confiar ou não. Pois o seu escritório de trabalho funcionava em seu próprio
apartamento. Ou seja, seria somente os dois, pois ele não era casado. As suas
condições trabalhistas soavam excelentes, ainda mais para quem estava
precisando. Porque viver de Literatura no Brasil é bem complicado. Embora
pudesse decorrer facilmente por alguns gêneros Literários o campo do erótico
era o seu preferido. E aquele convite de Heitor Kannemberg vinha bem a calhar
na atual situação em que se encontrava. E ainda teria um tempo para desenvolver
os seus próprios projetos.
No
decorrer de alguns dias, Heitor Kannemberg foi passando como trabalhariam e as
funções que deveria executar. Algo como horário, tarefas e principalmente as
condições. Por último, ele lhe passou o endereço e pontos de referências e
marcaram o dia no qual Lilla deveria iniciar a trabalhar. Tanto um quanto o
outro estava ansioso.
No
final de semana que se antecedeu ao dia, Lilla Bittencourt se preparou
escolhendo a roupa com a qual iria para o seu primeiro dia de trabalho, arrumou
os cabelos, fez as unhas e depilou-se.
Mal
dormiu de tanta ansiedade. E antes do celular despertar, ela já estava de pé.
Para não perder o horário, cuidou logo cedo do café, tomou banho, arrumou-se,
uma maquiagem de leve. Aguardou alguns momentos antes de sair, ouvindo músicas
em sua play list... Respirou fundo e saiu em direção à estação do metrô mais
próxima de seu bairro, para aquele horário, completamente lotada. E só em
pensar em ter que passar por aquilo todos os dias da semana a desanimava um
pouco. Mas pensava na compensação financeira que receberia e valeria à pena
cada sacrifício, já que no escritório de Heitor Kannemberg, ficaria sentada sob
o ar condicionado, mexendo no computador, fazendo algumas anotações, revisaria alguns
de seus textos, tendo assim acesso de primeira mão as suas criações.
No
trajeto do metrô até o seu bairro, Lilla procurou não pensar muito,
concentrou-se em sua respiração e na pouca visão que a janela lhe permitia visualizar do mundo lá fora de dentro daquela lata de gente. Foi despertada
quando ouviu o anúncio da estação na qual deveria descer. O endereço anotado em
um pedaço de papel no bolso do vestido, com os pontos de referências que Heitor
havia lhe passado e o que anotou da internet foi fácil localizar o prédio. Ao
se identificar, o porteiro autorizou a sua entrada, pois o seu nome já se
encontrava na lista de permissão. O que dava todo um ar formal.
Afinal de contas, seria a primeira vez em que ela e Heitor se encontrariam
pessoalmente.
O
elevador acionou e foi parar no andar desejado. Enfim, encontrava-se no
corredor em frente à porta do apartamento de Heitor Kannemberg. Quem realmente
seria este homem?
De
imediato, ao tocar a campainha, a porta se abriu, sendo recebida pelo próprio que,
antes de mencionar qualquer palavra a examinou dos pés à cabeça.
Lilla
Bittencourt ou quem quer que ela seja não era uma mulher de chamar a atenção
por onde passava, mas tinha lá os seus atrativos. O que seria do azul se todos
gostassem do amarelo?
-
Bom dia! – Lilla Bittencourt tentou cortar o silêncio.
Mas
ele não a respondera e continuava em silêncio, examinando minuciosamente, como
se possuísse uma visão de raio-x o seu corpo por cima da roupa.
Lilla
começou a bater a ponta do pé direito demonstrando a sua inquietação pela falta
de consideração ou até mesmo de educação e sem perceber fez um estalo com os
dedos.
-
Entre... Fique à vontade! Não é assim que costumo receber as visitas e nem
muito menos quem trabalha ou trabalhará comigo! – Ele tentou se justificar.
Lilla
deu um passo à frente e em um movimento natural parte de seus cabelos bateram
no ombro de Heitor Kannemberg que sentiu o seu perfume.
-
Embriagador... – Disse ele.
-
O que disse? – Ela quis saber.
-
Tem um excelente gosto para perfume! – Ele a elogiou.
-
Obrigada! – Ela agradeceu.
Aquela
situação era um tanto diferente. Uma coisa era estar por atrás de um computador
ou na ponta da linha telefônica. Agora estar pessoalmente com Heitor
Kannemberg, por mais que tivesse fantasiado alguma coisa com ele, a partir
daquela manhã, conforme seguisse a pequena reunião sobre o trabalho, tudo dando
certo, ou seja, saindo da maneira que estivesse imaginado, ele se transformaria
em seu patrão, não mais um leitor de suas pequenas obras.
Heitor
Kannemberg lhe ofereceu algo para beber, ela aceitou apenas um copo d’água que
ele mesmo lhe a serviu sem o menor constrangimento.
A
ansiedade continuava a tomar conta de seu corpo, porém, procurou disfarçar da
melhor maneira possível. E sabendo lidar com o assédio na internet, não se
sentia tão à vontade com os olhares dele sobre o seu corpo.
Na
rede era diferente. Quando alguém a assediava através de comentários de seus
contos eróticos, ela respondia de tal maneira que a pessoa já a enxergava como
autora e não como personagem. Embora seja natural, o leitor tentar ou imaginar
a autora inserida na obra. Mas a imaginá-la como? Mas se nem ao menos o seu
rosto era estampado nos sites em que participava. Ou em seu próprio blog...
Havia muito mistério!
Ambos
se dispuseram cada um em uma poltrona, de frente para o outro, não muito
distante. As palavras de Heitor ecoavam pela ampla sala, decorada com
simplicidade, mas não deixava de ser requintada, mostrando um pouco de sua
personalidade, de modo natural, mas o seu olhar lhe dizia ao contrário:
Devorava-a feito um animal faminto. Talvez usasse de estratégia para não
assustá-la. E, no decorrer, ficou acordado todos os por menores e todas as
dúvidas foram sanadas. E, por fim, ele lhe mostrou o espaço físico que estaria
à sua disposição, assim como as suas dependências do apartamento. E o seu
quarto, localizava-se no final do corredor. Lilla Bittencourt sentiu um arrepio
quando ele lhe indicou a porta. No início, achou desnecessário, mas nada
comentou. Ela lhe pediu licença e se dirigiu ao lavado que lhe indicara à pouco
tempo. Ela tinha a necessidade de respirar um pouco e sozinha.
Ao
ocupar a sua mesa, ela tomou conhecimento de tudo o que ele lhe falara. A sua
primeira providência foi checar a sua caixa de e-mails. Os quais tivessem com a
seguinte marcação: Pessoal, ela não poderia abrir de modo algum. Com o tempo se
acostumaria..
No
seu primeiro dia, Heitor a acompanhou de perto, caso tivesse alguma dúvida. Até
almoçaram juntos. Ele foi muito cordial e solícito. E ao final do expediente,
fez questão de levá-la até a porta.
Ao
retornar para a sua casa, foi refletindo. E apesar de certa intimidade no mundo
virtual, Heitor soube se comportar.
***
Na
manhã seguinte, ao chegar à portaria, o porteiro lhe informou que Heitor não se
encontrava no apartamento e, que havia lhe deixado as chaves para entregá-la. E
muito educada, agradeceu a gentileza.
De
início, ficou um pouco receosa por ficar sozinha naquele apartamento, mas não
podia voltar, senão o seu emprego estaria em jogo e, teria assumido o
compromisso. E sem muito pensar, seguiu pelo corredor, pegou o elevador e
chegando ao andar, enfiou a chave e abriu logo a porta.
Ao
tomar o seu lugar, percebeu que Heitor havia lhe deixado um bilhete junto com
uma lista de tarefas do dia. E que assim que a cumprisse estaria liberada. No
PS que havia deixado, avisava que tinha deixado o almoço na geladeira e era
apenas esquentar no micro ondas.
-
E quem disse que irei almoçar? – Ela se perguntou para si mesmo.
Naquele
dia, ela parou apenas para ir ao banheiro, e por volta das 14:00 horas, ela
finalmente terminara.
Ao
desligar o computador, passou a mão na sua bolsa e deixou o apartamento
trancando a porta.
Ao
se dirigir ao elevador:
-
Com licença... Boa tarde! Esse não é o apartamento do senhor Heitor Kannemberg?
– Uma mulher loira, fazendo a linha fatal se aproximou.
-
Boa tarde! É sim! – Lilla a respondeu.
-
Não sabia que ele havia se casado! – A loira continuou.
-
Não! Não! Eu apenas trabalho para ele! – Ela continuou.
-
Sim! Compreendo... – Ela comentou.
-
Com licença! Preciso ir! – Ela se despediu entrando no elevador.
“O
que será que aquela mulher queria saber?”
Lilla
ficou pensativa, mas achou melhor deixar para lá.
Rapidamente
deixou as chaves com o porteiro e se despediu. Nem percebeu que ele ligara para
Heitor Kannemberg avisando que ela acabara de deixar o apartamento. Fez um
pequeno lanche na estação do metrô e se dirigiu para casa.
O
que será que Heitor Kannemberg pretendia com aquele jogo?
***
Em
seu terceiro dia de trabalho, Lilla Bittencourt encontrou com Heitor, mas ele
apenas lhe deu algumas instruções, chamando a sua atenção por ter deixado de
almoçar no dia anterior e, deixou-a sozinha, mas antes do horário do almoço,
ele retornou e compartilharam desse momento como em outro dia.
Naquele
mesma data, ele à dispensou um pouco mais cedo, porque receberia visitas e
desejava ficar a vontade com elas. Então, ela lhe pediu licença e foi se
preparar no lavado, e se despediu saindo um pouco sem jeito, mas com uma
pontinha de ciúme aflorando em seu coração. Logo se lembrou da loira da tarde
anterior. Mal sabia ela que aquele homem prestava atenção em cada detalhe, no
menor possível... No mínimo de suas reações.
***
-
Mas ele disse visitas... Enfatizando o plural! Mas sabe de uma coisa? Deixa pra
lá! Não é problema meu! – Ela saiu falando sozinha.
-
Boa tarde senhorita Lilla! Está com algum problema? Posso ajudá-la? – Queria saber o porteiro.
-
Desculpa seu Antonio! Só estava falando com os meus botões! Boa tarde! – Ela se
corrigiu.
-
Tão nova! Vai ver que está com algum problema. – Ele falou ao vê-la se
distanciando e ficou pensativo.
No
caminho de casa, Lilla tentava imaginar o que poderia estar acontecendo naquele
apartamento. Para tentar se distrair retirou um livro da bolsa e mergulhou no
seu mundo de fantasias, ao menos teria o prazer da leitura.
***
Em
seu quarto dia, recebeu as chaves das mãos do porteiro.
-
Bom dia senhorita Lilla! - Ele a
cumprimentou.
-
Bom dia seu Antonio! – Ela retribuiu.
-
O senhor Heitor disse que está descansando em seu quarto, mas pediu para lhe
entregar as chaves. – Ele continuou com o recado.
-
Tudo bem! Vou subir e fazer o meu trabalho. Obrigada! – Agradeceu Lilla.
Ao
entrar no apartamento, não pôde deixar de notar algumas taças usadas no bar. E
duas delas possuíam manchas de batom. Lilla tocou em uma, levando-a próximo as
narinas, como desejasse arrancar dali alguns segredos.
-
Bem que eu imaginei! – Disse em voz alta.
Neste
instante foi interrompida por um pigarro do patrão que se aproximou trajando
apenas um roupão.
-
Bom dia! Desculpe a ousadia do meu traje! – Ele a cumprimentou com sarcasmo.
-
Bom dia! Tudo bem! Acredito que possuímos um pouco de intimidade para tal fato!
– Ela continuou.
-
Mas de um jeito ou de outro, sou o seu chefe! – Ele frisou.
Neste
momento Lilla corou ao perceber certa protuberância que se formava por baixo do
tecido, fazendo com que se sentisse febril.
-
Com licença! – Ela pediu.
-
Não precisa ser tão formal. Agora é minha vez... Já dissertamos sobre tantas
coisas pela rede ou via telefone. – Foi a vez dele pedir.
-
Mais uma vez, com licença! – Lilla falou e se dirigiu para a sua mesa de
trabalho e ele se retirou.
Heitor
Kannemberg não apareceu mais no decorrer do dia. Ela não tirou o seu horário de
almoço. Ao terminar, deixou um bilhete e da mesma forma que ele fizera de
manhã, entregou as chaves ao senhor Antonio. Assim, evitaria fofocas com o seu
nome pelos corredores do prédio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário